19 de fevereiro de 2013

Gocce I



'Diálogo - novo nome da caridade'. Esta é, sem dúvida, uma das afirmativas mais conhecidas do pontificado de João Paulo II, da qual, que eu saiba, ninguém discorda. 
No entanto, há diálogo e diálogo, como há amor e amor. Há, por exemplo, o diálogo dos dois surdos. É aquele no qual um dos interlocutores lê o jornal do dia e o outro mantém um olho na TV e o outro no controle remoto: 


- "Foi tudo bem hoje?" 
- "Hum? ... Hum! Tudo bem..." 
- "Nossa! Outro acidente, você viu?" 
- "Foi, né..." 

E os dois, que, na verdade, nunca saíram do seu próprio mundo, mergulham, sem disfarces, de volta às suas profundezas egoístas. 



Há o diálogo entre o surdo e o que fala demais e, se fala muito, é porque tem imensa necessidade de ser ouvido. Tanto, que o falador até finge não perceber que o outro não está interessado nele. É uma questão de falta de interesse na pessoa, não só no assunto. Se fosse outra pessoa, qualquer assunto seria interessante. 

- "Hoje aconteceu uma coisa incrível!" 
- ... 
- "Tatatá, tatatá, tatatá..." 
- "Hum...", faz que responde o surdo, sem levantar o olhar. 
- "Sabe o que eu acho?" 
- ... 
- "Tatatá, tatatá, tatatá..." 

E o surdo se afasta, sem perceber que deixou sozinho aquele com quem jamais havia estado. 



Existe ainda o diálogo do solitário com a própria imaginação, com os próprios pensamentos e sentimentos que nem sempre coincidem com a realidade do outro. É o caso do diálogo entre eu e alguém, no qual eu assumo o papel dos dois interlocutores... acabo desistindo de dialogar. 

-"Puxa, eu queria tanto ir, eu chegaria lá e diria... Mas eu tenho certeza de que ela nem vai ligar... nem vai abrir a porta, a não ser que eu mande aquela amiga dela chamar e entre junto...Aí ela vai dizer: "Ah, você veio também..." Aí vai dar aquela olhada de "preferia-que-você não tivesse-vindo-ela" Aí eu vou ficar arrasada... Ai meu Deus, não adianta... Já estou começando a chorar agora! É melhor não ir... afinal, não faz diferença mesmo... ela nem vai notar que eu não fui. 



Existe, ainda, o diálogo que parece mais não é. É aquele em que a pessoa não só se cala para ouvir, mas, aparentemente, escuta. Tem o ar acolhedor, balança assertivamente a cabeça, até reage com expressões faciais ao que o outro diz, chega mesmo a dizer uma palavrinha aqui, a soltar uma interjeição ali, mas, em seu coração, já tem pronto o que vai dizer, já tem a idéia feita, pré-concebida, pensada antes do diálogo começar, sem levar em conta o que seria dito pelo outro. Em geral, depois de muito "escutar" a resposta será: 

- "Entendo o que você disse, e até acolho e concordo com muitas coisas, mas..." e descarrega o que já trazia na algibeira. 
Parece caridade, mas não é. Parece escuta, mas não é. Parece acolhida, mas não é. Parece diálogo, mas não é. 



O diálogo-novo-nome-da-caridade é fácil de identificar. Com o coração - não é verdade que a gente "sente" quando é autêntico? - mas também com a razão. O diálogo-caridade acolhe 'de verdade', com sinceridade profunda, a pessoa inteira e tudo o que ela quer dizer. Respeita a opinião do interlocutor e, paciente, não busca os próprios interesses, mas os do outro. Além disso, não se irrita, nem se impõe, orgulhoso, mas, humilde, busca a justiça da vontade de Deus e se alegra com a verdade a que ambos, juntos, chegam. 

Com o rosto alegre e sem fingimento, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. Este diálogo, este sim, é o novo nome da caridade. 



- "Ave!", disse o anjo. 

" Maria perturbou-se... " e, porque o diálogo-caridade está atento ao menor movimento da alma, o anjo pôde responder: 

- "Não temas!" 

E, como quem se sente acolhido não tem medo de expressar-se com liberdade: 

- "Como se fará?" 

Pela ladeira da acolhida, desce, depressa, o amor: 

- "A Deus nada é impossível!" 

Fruto e razão de todo diálogo-caridade, o Verbo, diálogo do Pai com o homem, acolhe-nos inteiramente, ainda em nosso pecado, e responde ao nosso clamor milenar. Faz-se o "sim" absoluto do Pai. 

Você entendeu? Acolheu? Jóia! Agora é a sua vez. Responda. Ressuscite. 



Maria Emmir Nogueira



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...podas...quando você comenta eu posso crescer...pensar...amadurecer a idéia...